sexta-feira, dezembro 15, 2023

O lume de Sidney Lumet: cinco grandes filmes

 Sidney Lumet (1924-2011) é um diretor que admiro, mas que não entrou na minha lista do TOP TEN DIRETORES FALECIDOS

E por que ele não entrou?

Por que uma lista de TOP TEN é um recorte bem reduzido para quem gosta de cinema, pode crer.

E porque para entrar no TOP TEN diversos tipos de sensações precisam ser levadas em conta. 

Filmes do tal diretor devem provocar reações de várias naturezas, como emocionais, táteis, auditivas, intelectuais...

Já declarei outras vezes que muitos diretores despertam meu intelecto, mas não tocam meu coração.

Outros conseguem fazer isso com um ou dois filmes, mas para entrar no TOP TEN, tem que ser algo recorrente.

Enfim, tudo isso para me desculpar com o Lumet, porque embora ele mereça estar no TOP TEN de qualquer cinéfilo que se preze, no meu caso está "apenas" no meu TOP TWENTY.

É um deleite esmiuçar a carreira dele.

Tenho assistido a vários este ano, todos retirados no acervo da Zílvia Locadora de Passo Fundo.

A seguir uma pincelada sobre cinco grandes filmes representativos de sua intensa filmografia:

LONGA JORNADA NOITE ADENTRO (1962)


Uma das características mais marcantes da obra de Lumet (sim, afinal, alguém aí duvida que ele seja um cineasta autoral?) é a íntima relação com o teatro e com os ensaios dos atores.

Lumet baseia seu trabalho nesse contato com os atores, em explorar o talento de cada um, empoderar, apoiar, ensaiar e improvisar.

É um cara de muitos verbos e poucos adjetivos.

Busca uma linguagem sem floreios, uma narrativa visceral.

Isso pulsa nesta adaptação da peça teatral de Eugene O'Neill.

Personagens tipicamente eugenianos e tipicamente lumetianos.

Densos, redondos (ou seja, no jargão da Teoria Literária, personagens surpreendentes, não lineares), com traumas a serem superados.

Para dar uma ideia da força deste filme só vou dar um depoimento bem intimista.

Estava lá eu assistindo a um filme preto e branco, sem explosões, tiros e cenas de ação na sala de vídeo, que é um dente da sala de estar sem porta de separação quando o meu caçula de 11 anos passou por ali, sem eu chamar é claro, e se deitou diante da mesa de centro e escorou os pés na gaveta dos blu-rays, como ele gosta de fazer, e se abancou no tapete preto de cerdas longas, olhos vidrados.

Como eu, embrenhou-se naquela narrativa baseada em diálogos fortes e cenas de uma força absurda.

Alô minha querida amiga de Brasília, minha maior crítica por expor meus filhos a filmes acima da idade recomendada, dessa vez, não tive culpa. 

Põe a culpa no Lumet.

VIDAS EM FUGA (1960)

Este é um dos filmes que teria sido oferecido a Elvis, mas que o Coronel Parker teria vetado.

De posse dessa informação, é difícil não imaginar como Elvis teria se saído vivendo o papel que acabou no colo de Marlon Brando.

Um músico perdido nos confins de uma cidadezinha, acaba sendo "adotado" por uma senhora mais velha, casada com um inválido.

A tensão sexual vai crescendo e o inevitável só não explode porque as cenas são delicadamente construídas e sugeridas. Mas o fato é que Val Xavier e Madame Torrance (Anna Magnani) cedem ao desejo.

Victor Jory faz um tremendo trabalho no papel de Jabe Torrance, um homem doente e amargurado que vai revelar um horrível segredo à esposa.

Elvis perdeu de trabalhar com Lumet, mas o filme seria um anticlímax para os seus fãs, que em novembro de 1960 lotaram os cinemas para assistir a Saudades de um pracinha.

O HOMEM DO PREGO (1965)

Filme sobre a desilusão, sobre o humano transformado em algo sem alma, ou será que o homem do prego, interpretado imortalmente por Rod Steiger, ainda tem alma por trás daqueles olhos vazios, aquela voz monótona, aquela aparência de zumbi e aquela rigorosa postura comercial?

Que sofrimentos passou esse homem para ter se tornado assim?

É a pergunta que Lumet responde ao espectador, da forma mais mágica e verdadeira possível.

Não é à toa que muitos consideram essa atuação a melhor de Steiger.

UM DIA DE CÃO (1975)


Um dos clássicos de Lumet, filme para ser visto e revisto. 

Primeiro filme de Lance Henriksen.

Primeiro filme de Chris Sarandon.

Oscar de Melhor Roteiro Original.

Se não viu ainda, dê um jeito de ver.

Básico no currículo de qualquer cinéfilo que se preze.

Please, faça um favor para si mesmo(a) e

assista a este filme e de preferência assista aos extras do dvd.

Cada vez que assisto a este filme eu me faço a pergunta que fiz acima na introdução ao post, e fico um pouco envergonhado por Lumet não estar no meu TOP TEN...

REDE DE INTRIGAS (1976)



Uma dobradinha admirável na sequência após Um dia de cão.

Quatro Oscars desta vez: 

Melhor Roteiro Original.

Melhor Ator

Melhor Atriz

Melhor Atriz Coadjuvante.

O fato de Lumet nunca ter ganho Oscar de Melhor Diretor mostra o quanto a categoria é competitiva,

e talvez, o quanto as decisões da Academia podem ser discutíveis.

Como prêmio de consolação, em 2004, ele ganhou um Oscar Honorário.

Mas o fato de que seu elenco foi premiado ameniza um pouco essa lacuna, pois mostra o quanto ele deixava o elenco brilhar, sem chamar atenção para si mesmo.

Uma grande qualidade para um diretor - não só de cinema, mas de qualquer atividade.