segunda-feira, março 25, 2024

Dilemas de um cinéfilo ou Adão Negro


 Com Dwayne The Rock Johnson no papel principal, Adão Negro lidera os filmes mais assistidos na plataforma Prime Video. Sobre o que penso dessa história da banalização do entretenimento e pulverização por múltiplas plataformas de streaming, acredito que o(a) leitor(a) já tenha percebido que encaro isso de modo cético. Sou por natureza um moviegoer, frequentador de cinema. Mas por ironia do destino, a cidade onde moro não tem uma sala de cinema sequer. 

Assim, acabo deixando de ver muitos filmes no cinema, e confesso que este filme entrou em cartaz em Passo Fundo, a 40 km daqui. Mas o interesse para ver não justificava uma viagem.

Isso é outro problema, a programação das salas do Laser e do Arcoplex, as duas redes que dominam os cinemas de Passo Fundo. Rarissimamente colocam filmes de arte em cartaz, filmes internacionais ou alternativos. Reina a redundância e a falta de imaginação na programação. Filmes como Zona de interesse ou afins acabam não vindo para o interior. Ou o sujeito passa uns dias na capital e faz uma imersão cultural ou tem que esperar entrar numa plataforma, mas assinar todas as plataformas é inviável.

Então acaba que o acesso a alguns filmes fica muito prejudicado por esse sistema capenga, no qual a mídia física praticamente inexiste mais.

Mesmo que a pessoa queira ver, não consegue.

Voltando à vaca fria, Adão Negro lidera os mais vistos no Prime Video. E por que lidera?




Fácil de responder. Uma parcela substancial dos assinantes provavelmente não teve oportunidade de conferir no cinema ou passou batido quando o filme estava em cartaz. Agora, para valorizar os suados reais gastos na assinatura, o assinante precisa ter algum tipo de retorno, nem que seja assistindo a um filme malhado pela crítica.

E por que Adão Negro é malhado pela crítica?

Por que a crítica adora malhar, faz parte de sua natureza ser arrogante e elitista. Tudo que as massas adoram, a crítica não pode gostar. O ditado "A voz do povo é a voz de Deus" é uma aberração para os críticos. Mas tem crítico que gostou.

O meu filho de 11 anos, que vai completar 12 no dia 5 de abril, assistiu comigo.

Ele reclamou que o roteiro é muito rápido, não dá tempo da pessoa respirar, faz a história andar de modo vertiginoso.

Um comentário interessante, que eu levo como elogio à inteligência dele, e aos outros filmes que ele tem visto comigo ultimamente, entre eles os do diretor Sergio Corbucci, em que cada cena é aproveitada ao máximo e o roteiro praticamente inexiste.

Engano meu ou já usei o verbo inexistir vezes demais neste post?

Sei que se eu disser que inexiste algum leitor que não sabe responder a essa pergunta, estarei mentindo, pois tem leitores(as) deste blog muito atentos(as). 

Bem, o número de palavras de um post tem que ser limitado, não pode exceder um número específico, e eis que já escrevi o número de palavras do post sem praticamente uma linha sequer sobre o filme em si. 

Se eu disser que inexistem regras para escrever uma resenha, estarei mentindo, assim, confesso que este texto não pode ser classificado como resenha, muito menos como uma resenha de Adão Negro, um filme de ritmo vertiginoso, como bem apontou o Antônio, mas tem uma coisa que preciso comentar, nem que seja em homenagem à minha finada mãe.



O filme tem a participação de um dos atores que ela amava, o Pierce Brosnan, em um papel bastante importante, o Senhor Destino, que o veterano interpreta com humor e elegância, como é de seu costume. O ex-007 está em plena forma quando o assunto é dar charme a um personagem.

sábado, março 02, 2024

Raça brava

 


Com roteiro original e diferente, Raça brava é um faroeste sob medida para quem ama aventura, romance e, de quebra, a raça Hereford.



Um dos principais personagens do filme é Vindicator, jovem touro da raça Hereford (cuja pelagem no RS é chamada de "pampa"), recém-chegado aos EUA trazido de navio, em companhia das proprietárias inglesas, a pertinaz viúva Martha Evans (a grande atriz irlandesa Maureen O'Hara) e a filha dela, Hilary (Juliet Mills).

Estamos na Exposição de Criadores de Gado de Corte de St. Louis, em 1884.

De temperamento manso, o touro mocho é uma grande novidade em terras americanas. Por essas qualidades raras, é vendido como reprodutor no leilão por 2 mil dólares. Mas o intermediário que fez o lance vencedor tem segundas intenções com Martha, que, revoltada com o assédio, decide levar o touro pessoalmente ao comprador original.

Para isso, vai contar com a ajuda de Sam Burnett (James Stewart), um caubói muito competente, porém muito chegado a se meter em confusões e brigas. Para ajudar um amigo que se machucou no trabalho e não obteve auxílio financeiro do patrão, Sam aceita o suborno do outro interessado que havia perdido o leilão, que oferece 1000 dólares para ter o touro. Sam pega o dinheiro e dá ao amigo, mas se vê numa enrascada, entre sua admiração por Martha e a situação em que se meteu.

São muitas as peripécias que esses quatro personagens  mãe e filha, caubói e o adorável Vindicator  vão enfrentar no caminho até o Texas, no rancho de Alexander Bowen (Brian Keith), teimoso criador da raça Longhorn.



O sonho de Martha é que as qualidades da raça Hereford sirvam como ferramentas para melhorar as raças locais, e essa ideia de fazer o melhoramento genético acaba influenciando o rústico Sam Burnett, que, por sinal, nesse processo inevitavelmente também se apaixona pela irresistível (e ruiva) Martha.



Quando Sam, Martha, Hilary e Vindicator estão cruzando por um desfiladeiro, uma boiada de longhorns vem no sentido contrário, conduzida por Jamie Bowen (Don Galloway), mas um ladrão está de tocaia e vai causar um estouro da boiada.



O fato prepara a fase principal do filme, que contrapõe as ideias retrógradas de Alexander Bowen e as inovadoras de Martha. O fato de o rabugento rancheiro também se apaixonar por Martha permite algumas ótimas cenas cômicas.




 Dirigido pelo especialista em aventura Andrew McLaglen, o filme tem como curiosidade no elenco o menino Larry Domasin (o amigo de Elvis Presley em O seresteiro de Acapulco) que interpreta um dos garotos que moram na fazenda.

Brian Keith está ótimo como Bowen, o rancheiro cabeça-dura que tenta conquistar Martha, mas quem lidera mesmo o elenco são os protagonistas, Maureen O'hara, que contracenou com John Wayne em vários filmes, como Depois do vendaval, e tinha com ele uma forte amizade; e James Stewart (astro de Janela indiscretaNúpcias de escândalo e A felicidade não se compra, para citar apenas três). 

Uma das partes mais bonitas do filme, que mostra a paixão pela raça Hereford, é quando Vindicator, já na nova estância, desaparece na nevasca.

Bowen, o teimoso criador de Longhorns, por bravata, e certo de que Vindicator não cobriu nenhuma de suas vacas, promete a Sam que, se aparecerem bezerros híbridos, ele pode ficar com eles e iniciar uma criação nova.

Quando chega setembro, na estação que nasce a terneirada, Sam procura, no meio dos capões de mato, embaixo das macegas, os bezerros recém-nascidos, ansioso por achar algum filho de Vindicator.




A importância deste filme na história do faroeste e de Hollywood é festejada em um post comemorativo do Museu Sid Richardson, que ressalta mais uma curiosidade: a trilha sonora é feita por ninguém menos que John Williams, que na década seguinte faria a trilha de Tubarão.


Mas o ponto mais forte do filme é justamente o roteiro bem construído, que mescla aventura e romance, com bons diálogos e falas espirituosas, focalizando com originalidade o aprimoramento genético do rebanho com o uso da raça Hereford.