terça-feira, janeiro 02, 2024

Rebel Moon


Sempre que penso em escrever algo sobre o cinema de Zack Snyder me vem à mente uma palavrinha da língua inglesa: self-indulgement.

Essa palavrinha, além de bonita e chique, exige do tradutor algo mais que uma solução fácil. 

Na categoria de dificuldade para traduzir, enquadra-se como "tricky".

A letra de uma canção de Lulu Santos me vem à mente quando me lembro da palavra "self-indulgement".


Tempos modernos

Eu vejo a vida melhor no futuro

 Eu vejo isso por cima de um muro de hipocrisia

Que insiste em nos rodear

Eu vejo a vida mais clara e farta

Repleta de toda satisfação que se tem direito

Do firmamento ao chão


Eu quero crer no amor numa boa

Que isso valha pra qualquer pessoa

Que realizar a força que tem uma paixão

Eu vejo um novo começo de era

De gente fina, elegante e sincera

Com habilidade pra dizer mais sim do que não


Hoje o tempo voa, amor

Escorre pelas mãos

Mesmo sem se sentir

Não há tempo que volte, amor

Vamos viver tudo que há pra viver

Vamos nos permitir


Zack Snyder é o tipo do cara que, mesmo sem conhecer a canção de Lulu Santos, vive se permitindo fazer filmes assim, self-indulging.

E digo mais. Eu sou o tipo do cinéfilo que se permite assistir a filmes de Zack Snyder pelo puro prazer de assisti-los.

Ficar julgando um filme de Zack Snyder com palavras rasas é algo surreal como Sucker Punch, outro filme de Zack Snyder, talvez o mais self-indulging de todos os filmes, com o elenco mais delicioso de todos os tempos.

Eis que a discussão sobre Rebel Moon empacou numa outra palavrinha, esta da língua portuguesa. Você lê os comentários do honorável público sobre o filme e se depara em 7 a cada 10 com variações desta palavra.

"Raso". 

Até o fato de essa palavra se repetir parece uma certa falta de profundidade, ao menos por parte desses pseudocríticos de araque de plantão.

Em se tratando de algo como arte, o que é raso e o que é profundo varia conforme a percepção de cada um.

Às vezes, a profundidade pode estar oculta no que aparenta ser "raso".

"Cópias" podem ser encaradas como influências e citações ou homenagens.

Mas, entrando no mérito da questão, acredito que, em seu novíssimo filme Rebel Moon, disponível na Netflix, Zack Snyder não tentou ser profundo. Tentou ser ele mesmo.

E não há maior mérito a um diretor autoral.

Ele não é o tipo de pessoa que a toda hora tenta chamar atenção para si mesmo, dizendo: "Olhem como sou profundo".

Se você quiser posar de cinéfilo metido a profundidades, assista aos filmes de Ingmar Bergman e Fellini.

Escreva sobre eles.

Não assista ao novo do Zack Snyder só para malhar.

E se quiser malhar, não seja "raso" na escolha dos adjetivos, procure embasar melhor o seu texto, com uma resenha de meio, começo e fim.




 


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