domingo, abril 08, 2007

O crocodilo

Em Il Caimano (2006), o diretor Nanni Moretti volta a misturar ficção com realidade, e a mesclar temas como a preocupação com as relações familiares, a situação política de seu país e a vida profissional de um diretor de cinema. Aprile (1998) relatava a experiência de um diretor de cinema às voltas com as suas produções fracassadas, o nascimento do primeiro filho e as eleições na Itália, que acabaram levando Silvio Berlusconi ao poder. No seu mais recente filme, o realizador italiano (que em 2002 obteve a Palma de Ouro de Melhor Filme, com O quarto do filho) conta a saga do diretor de filmes B Bruno Bonomo (Silvio Orlando) - cujo casamento com Paola (Margherita Buy) está em fase terminal - no esforço de manter-se no meio cinematográfico, fazendo um épico ambicioso sobre Cristóvão Colombo. O plano soçobra, e a alternativa é um roteiro chamado "Il Caimano", que lhe havia sido entregue durante uma sessão de cinema, por uma moça desconhecida com um bebê de colo. Bruno faz uma leitura 'em diagonal' do roteiro e resolve convencer os produtores a financiar o filme - sem perceber que a história contada por Teresa (Jasmine Trinca) é, na verdade, baseada nos fatos políticos italianos e uma crítica ao primeiro-ministro Silvio Berlusconi.
Em O crocodilo, a exemplo do que fez em Abril, Moretti estabelece um jogo onde a ideologia política é um dos elementos, sem, entretanto, perder a autocrítica; até o próprio Bruno, a certa altura, comenta que é 'muito fácil fazer um filme ideológico'. No âmbito familiar, se o filme de 1998 enfatizava a expectativa de um pai de primeira viagem, agora o foco é a separação de um casal com dois filhos pequenos (um de 9 e um de 7). A solitude de Bruno é tanta que ele passa a dormir no estúdio, numa cama improvisada em meio aos rolos de filmes como "O Mocassim Assassino", "Machistas Contra Freud" e "Cataratas". Uma cena síntese do estilo Moretti é a que Paola e Bruno, após assinar o divórcio, emparelham seus carros no trânsito e trocam olhares, ao som de Blower's daughter, de Damien Rice. Sim: os bons cineastas não têm medo de serem rotulados de piegas.

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