terça-feira, novembro 07, 2017

Pedro Almodóvar


Escrito em francês por Thomas Sotinel, colunista de cinema do Le Monde, e traduzido para o inglês por Imogen Forster, o livro Pedro Almodóvar é mais um volume da coleção Masters of cinema, editado pela Cahiers du cinema.

O livro é estruturado em uma Introdução seguida de 4 capítulos:
Um homem de La Mancha,
De que é feito um diretor?,
Um diretor ao pé do Monte Olimpo e
Obras-primas.

No final, como em toda a coleção Masters of cinema, o livro traz Cronologia, Filmografia e Bibliografia selecionada.

Conforme o livro, gosto de ler com uma lapiseira em punho. Sublinho, faço asteriscos à margem, escrevo palavras-chave nos rodapés. 

Alguns dos trechos que eu realcei durante a leitura de Pedro Almodóvar:



INTRODUÇÃO

"Almodóvar não é um intelectual; o pai dele foi um condutor de mulas de La Mancha, e enquanto ele estava trabalhando  para a companhia telefônica espanhola Telefónica, aprendeu cinema como autodidata sem a ajuda de qualquer instituto ou universidade de cinema." (p.5)

Segundo Sotinel, Pedro Almodóvar ainda hoje é objeto de controvérsias ferozes, e, embora pudesse ter se tornado um diretor "internacional", ele permaneceu completamente espanhol, "filmando histórias cada vez mais sofisticadas e criando entre seus compatriotas um misto de admiração e exasperação".



UM HOMEM DE LA MANCHA

"Antonio Almodóvar foi o último de uma extensa linhagem de condutores de mulas dedicado a transportar vinho de Calzada de Calatrava a El Centenillo, uma cidadezinha andaluza a 50 km de distância."

Diga-se de passagem, isso talvez seja mais verdadeiro do que a informação que consta no livro "Great Film Directors", de que o pai de Almodóvar era um "winemaker".

As pessoas que nascem na região são chamadas de "manchegos". Almodóvar teria dito numa entrevista a Nuria Vidal que "a imagem de um manchego é a de um homem cujo único espelho é a água de seu poço. Em La Mancha, costumavam acontecer, e ainda acontecem, muitos suicídios. As pessoas se enforcam ou se jogam no poço."

A mãe dele escrevia e lia cartas para os vizinhos, como a personagem de Central do Brasil. O pequeno Pedro percebeu que a mãe dele embelezava as cartas que lia para satisfazer as expectativas dos destinatários.

Nascido em 1949, por volta de 1960 Pedro começou a frequentar os cinemas na companhia do irmão Agustín. Ao chegar em casa, contava as histórias para as irmãs dele, sempre reinventando.

Após fazer o serviço militar na Força Aérea, em 1969, ele conseguiu um cargo administrativo na Telefónica, onde trabalhou durante 13 anos, inclusive no período em que se firmava como diretor.

Só saiu da empresa em 1982, após o lançamento de Labirinto de paixões.

Desde o começo, afirma Thomas Sotinel, o que importava para Pedro Almodóvar era contar histórias. Em 1974, começou a fazer curtas com uma câmera Super 8. Seu primeiro curta foi Duas putas, ou, uma história de amor que termina em casamento (1974).

O filme de estreia em longa-metragem foi Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, em 1979.



DE QUE É FEITO UM DIRETOR?

Este capítulo analisa os filmes Labirinto de paixões (1982) até A lei do desejo (1987).

Desta primeira fase almodovariana, só assisti a Matador (1986).

Segundo Sotinel, este filme de grande orçamento custou bem mais do que os anteriores, e de todos os filmes de Almodóvar, é que consegue retratar a Espanha com mais exatidão.

"Apesar da cor saturada da fotografia de Ángel Luis Fernández e da música extrema de Bernardo Bonezzi, o filme pode criar um impressão quase de frieza, não fosse pela estupenda atuação de Antonio Banderas como um garoto perdido, inocente inclusive do crime que ele cometeu."





UM DIRETOR AO PÉ DO MONTE OLIMPO

O capítulo comenta aspectos da realização dos filmes seguintes, desde Mulheres à beira de um ataque de nervos (1988, filme de máximo apelo para as massas) até A flor domeu segredo (1995).

Sucesso de público, Mulheres à beira... foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Em Los Angeles, Almodóvar se encontrou com Billy Wilder, que o aconselhou: "não se deixe seduzir canto da sereia de Hollywood".

A flor do meu segredo marcou o início da colaboração com o diretor de fotografia brasileiro Affonso Beato e o compositor Alberto Iglesias. "Cada qual a seu modo, Beato e Iglesias ajudaram a criar o que seria o novo estilo de Almodóvar, o de um artista com o pleno domínio de sua visão, sem mais precisar recorrer à provocação ou excesso, mas sem render-se às normas da razão e do bom gosto."
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Aqui são abordados os filmes Carne trêmula (1997), baseado no livro de Ruth Rendell, Live Flesh; Tudo sobre minha mãe (1999, Oscar de Melhor Filme Estrangeiro), Fale com ela (2002, Oscar de Melhor Roteiro), Má educação (2004), Volver (2006) e Abraços partidos (2009).

O livro se encerra às vésperas do lançamento de A pele que habito. (2011). Depois ele ainda lançou Amantes passageiros (2013, aguarde post em breve) e Julieta (2016). Este último concorreu no Festival de Cannes, e o jornalista Rodrigo Salem registrou a recepção ao filme nesta reportagem. Naquela ocasião, na entrevista coletiva, Almodóvar afirmou: "Jamais escreverei uma biografia e proíbo alguém de fazê-lo. Minha vida está nesses 20 filmes".



Comentário sobre o livro:


Sotinel aborda detalhes das histórias que talvez não precisassem ser abordados. As melhores partes do livro são quando ele dá a sua opinião e faz ponderações.

Como a seguinte (com a qual, por sinal, não concordo plenamente):

"Os diretores que pertencem à última geração do cinema de auteur, a de Almodóvar, Nanni Moretti e Jarmusch, não têm herdeiros. O cinema no qual eles nasceram e cresceram está morto, e os diretores do terceiro milênio não alcançam (tampouco almejam alcançar) a estatura de um grande artista, coisa que a geração de Almodóvar herdou de diretores como Bergman, Truffaut e Scorsese."

E por que não concordo plenamente? Porque é meio pessimista e sombria. Existem diretores mais novos que são autores também, a seu modo, e do modo que a indústria hoje permite. E acredito que sempre irão existir realizadores talentosos, que não se "vendem ao sistema".

De todas as importantes informações que aprendi na leitura da obra, a que eu gostaria de não esquecer é a que consta na transcrição de um artigo publicado no jornal El País, em setembro de 1999.

O texto, escrito por Pedro Almodóvar, pouco após o falecimento de sua mãe, explica como foi vital para o trabalho dele observar o que a mãe dele fazia, embelezando as cartas que lia para os vizinhos analfabetos.

Aqueles improvisos da mãe "estabeleceram a diferença entre ficção e realidade, me mostraram como a realidade precisa da ficção para se completar, tornar-se mais agradável, mais tolerável...".

(...)
"Aprendi algo crucial para o meu trabalho: a diferença entre ficção e realidade, e como a realidade precisa ser complementada pela ficção para tornar a vida mais fácil."

E, sem dúvida, a vida fica bem mais fácil com os filmes de Almodóvar.
E a dos cinéfilos com a coleção Masters of cinema.

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