segunda-feira, outubro 22, 2018

Gosto de cereja (com alerta a pessoas spoilers-sensitivas)

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A bordo de sua Range Rover P38A, o sr. Badii percorre as vias urbanas em busca de alguém que se disponha a lhe prestar um serviço.

Primeiro,  ele tenta com o operário de uma construção. O moço se nega a entrar no carro, e, diante da insistência do sr. Badii, ameaça “quebrar a cara dele” se ele não for embora.

Na sequência, o sr. Badii dá carona a um jovem soldado de etnia curda. O moço aceita dar uma volta de carro antes de chegar ao quartel.
À medida que Badii se afasta da urbe e entra no meio rural, o soldado fica inquieto e pede para ser levado de volta. Badii continua e diz que o serviço será muito bem pago, o equivalente a seis meses de soldo por 10 minutos de trabalho.

Em meio à paisagem árida, estaciona à beira de uma estrada vicinal e tenta convencer o jovem a descer. Ele não concorda. Sr. Badii insiste e explica. Basta o rapaz ir até o local na manhã seguinte e chamar duas vezes pelo nome dele. Se ele não responder, é só jogar 20 pás cheias de terra para tapar a cova.

O soldado diz que não é coveiro e súbito foge espavorido.

O sr. Badii continua a tentativa de aliciar alguém. O próximo da lista é o vigia de uma pedreira, este de origem afegã. Ele tenta convencer o vigia a se ausentar do posto, mas ele não concorda.

Lá vai o sr. Badii de novo em sua Range Rover creme, cor que combina com a vegetação seca ao redor, e logo adiante oferece carona a um senhor que está na beira da estrada.

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E assim por diante.

A busca continua.

Estradas sinuosas e poeirentas serpenteiam em meio à vegetação seca.

Aqui e ali, uma árvore mantém o verdor de suas folhas.

Mas a cor deste filme é a cor de areia, a cor do deserto, em meio à qual a perua avança com seus dois ocupantes.

O motorista troca ideias com seus interlocutores, tentando explicar o seu intento, a sua decisão.

Um deles, um idoso taxidermista, procura demover o suicida de suas ideias, falando sobre as coisas bonitas da vida.

O ponto de vista da câmera ora é o do caroneiro, ora é o do motorista. Mas a câmera raramente sai do interior do veículo. As tomadas são longas, os diálogos espaçados. A câmera se detém nas expressões faciais dos atores, nem sempre decifráveis.

Gosto de cereja é o road movie mais parado da história da cinema.

O destino do sr. Badii não se afasta muito do burburinho da cidade. Um casal de turistas pede para ele tirar uma foto deles.

Quando o taxidermista do Museu de História Natural concorda em cumprir a missão, o sr. Badii terá de tomar uma decisão.

Na noite iluminada por relâmpagos, um táxi conduz o sr. Badii ao local. Ele fica contemplando as luzes da cidade, acende um cigarro.

Os sons da madrugada, o prenúncio da tempestade.

O homem se deita na cova e fita a lua em meio às nuvens negras. Será o fim para o sr. Badii? 

O filme foi covencedor da Palma de Ouro de 1997, junto com A enguia, de Shohei Imamura.

Roger Ebert esteve no Festival e fez uma resenha bastante desfavorável.

A resenha foi respondida por Jonathan Rosenbaum, um ocidental que procura entender a complexa obra de Kiarostami.

Outro crítico, Martin Purvis, em seu blog The Film Sufi, assevera que "In fact the film appears to appeal primarily to those viewers whose experience and appreciation of film is not direct and intuitive, but must always be mediated by intellectual reflection. Indeed to a certain extent the film illustrates the difference between the aesthetic qualities of film and text."
Por sua vez, Rosenbaum,  nesta entrevista, comenta a polêmica entre ele e Ebert, e faz uma análise elogiosa sobre a filmografia do controverso diretor iraniano falecido em 2016.
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