Com roteiro do australiano Tony McNamara e direção do grego Yorgos Lanthimos, Pobres criaturas (Poor Things) é uma fábula feminista com óbvias influências da obra de Mary Shelley, Frankenstein. A fonte original adaptada por McNamara é o romance Poor Things: Episodes from the Early Life of Archibald McCandless M.D. Scottish Public Health Officer, de Alasdair Gray, publicado a primeira vez em 1992, por sua vez, fortemente influenciado pelo clássico shelleyano.
Não é preciso ser um gênio em literatura universal para perceber esse vínculo logo ao ver o trailer do filme. A propósito, a revista Time abordou a ligação entre o filme Pobres criaturas e o feminismo no clássico Frankenstein nesta reportagem.
Godwin Baxter, cientista sequelado, mas brilhante (Willem Defoe), faz um experimento bizarro: encontra o cadáver de uma jovem suicida grávida, retira o cérebro da neném, implanta na mulher adulta, e em seguida a ressuscita.
Para acompanhar passo a passo a evolução de Bella (Emma Stone), contrata Max (Ramy Youssef), estudante de Medicina que, inevitavelmente, se apaixona pela destrambelhada, porém deslumbrante jovem.
Dia após dia, anota a evolução da moça, o vocabulário crescente, a inaptidão social.
Quando Bella dá um passo importante em sua vida sexual (aprende a se masturbar e a ter orgasmos), o Dr. Godwin resolve casá-la com Max. Para fazer o contrato, entra em cena um inescrupuloso advogado, o dândi Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo), que acaba se interessando por conhecer quem é essa misteriosa pessoa.
A partir daí, o filme envereda por um caminho em que Bella assume o protagonismo e as rédeas de seu destino.
A jornada de autoconhecimento de Bella vai passar por muitas etapas.
Em meio a viagens a países exóticos, aventuras e desventuras, a ingenuidade vai dando lugar à experiência e ao entendimento de como o mundo funciona.
Um destaque é a viagem a Portugal.
Em Lisboa, Bella se depara com uma fadista a tocar guitarra portuguesa e a entoar "O quarto". Atônita, de olhos vidrados, Bella escreve um novo capítulo dessa relação afetiva de Hollywood com o fado, fortalecida com "A canção do mar", de Dulce Pontes, no filme As duas faces de um crime.
Nesta entrevista no programa Bairro das artes, Carminho, a cantora lusa que aparece em Pobres criaturas, explica como foi a experiência.
O filme tem ótimos momentos de comédia, com atuações consistentes.
Perde um pouco o ritmo na segunda metade, talvez menos por culpa de Yorgos (cujo filme A favorita, de 2018, foi sucesso de crítica e público, faturando sete vezes o valor do orçamento) e mais dos tempos em que vivemos.
Hoje em dia, a metragem dos filmes está numa fase mais elástica do que antigamente. Diretores se apaixonam por suas obras e as estendem ao máximo, sem que ninguém ouse os repreender ou ordenar sábios e bem desejados cortes.
Pobres criaturas é um bom entretenimento, com uma forte crítica social, principalmente a nós... limitados, ridículos e patéticos seres do sexo masculino.
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