sábado, agosto 31, 2013

O reino gelado



Clássico da literatura universal recontado com a mais avançada tecnologia cinematográfica, O reino gelado nada mais é que a mais recente adaptação russa do conto de Hans Christian Andersen, A rainha da neve. Lançado no circuito internacional de cinema, The Snow Queen (Снежная королевa, 2012), com direção de Vladlen Barbe e Maxim Sveshnikov, é um encantador filme em 3-D.

Consegue unir a tradição com o moderno, ou seja, recontar, com a melhor tecnologia, uma obra imortal de modo respeitoso, mas sem medo de acrescentar aqui e ali novos e enriquecedores elementos. Entre as novidades, a presença de um arminho como bicho de estimação de Gerda, e a principal "mudança": Gerda e Kai são irmãos nessa adaptação do século XXI. 

Para quem pensa que os russos "não têm tradição em animação": a produção Снежная королева (não por acaso, também uma adaptação de A rainha da neve), do diretor Lev Atamanov, abiscoitou em 1957 nada mais nada menos que a Palma de Ouro em Cannes na categoria melhor animação. Quem quiser se deleitar com esse clássico da animação, pode conferir em cópia legendada em inglês no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=39PH16vpyXE.

Bolts & Blip: dois rôbos pirados

James Cameron afirmou em recente entrevista que o número de pessoas treinadas em utilizar a tecnologia 3-D na realização de filmes está aumentando de forma quase logarítmica. A julgar pela inundação de títulos muitas vezes obscuros que chegam às locadoras, essa afirmação deve ter algum fundo de verdade. Com o domínio da tecnologia, porém, nem sempre há um correspondente domínio do principal elemento de um filme: o roteiro. Muitos realizadores de filmes 3-D deveriam se preocupar mais com esse fundamento e menos com truques de imagem. A animação canadense/sul-coreana Bolts e Blip: dois robôs pirados procura requentar um misto de referências num roteiro um tanto caótico e com poucos elementos de surpresa. Os personagens são os mesmos da bem-sucedida série passada no canal Teletoon da tevê canadense e também nos EUA. Em tempo: meu filho de cinco anos deu nota 100 para o filme e ainda fez um comentário intertextual sobre a presença dos "schleprechauns", criaturas que remetem aos leprechauns do Gato Félix.

As aventuras de Sammy


Sammy, tartaruga-verde de 50 anos de idade, conta em flashback suas peripécias para dar a volta ao mundo, na companhia, entre encontros e desencontros, do amigo Ray e da amiga - e talvez algo mais - Shelly. As aventuras incluem a travessia pelo canal do Panamá e uma visitinha à Antártica, sempre enfrentando a poluição e a falta de consciência ecológica dos humanos, e, esporadicamente, contando com a ajuda deles. Importante nome no desenvolvimento dos filmes 3-D, o diretor belga Ben Stassen fundou em 1994 a nWave Pictures, inovadora produtora de filmes em formato IMAX. Em 2004 realizou Wild Safari, pioneiro documentário sobre vida selvagem para as gigantescas telas de IMAX. Com Os mosconautas no mundo da lua (2008), Stassen conta a história de três moscas astronautas, no primeiro filme planejado, criado e lançado apenas em 3-D. Crítico da massificação do 3-D, classifica muitos lançamentos estadunidenses como filmes "2,5-D" – quando os realizadores não se esforçam para utilizar o 3D como uma linguagem nova. No making of de As aventuras de Sammy, Ben Stasser define sua visão dos revolucionários recursos do 3-D: "Abordo o cinema 3-D como uma nova linguagem. Crio o filme de modo totalmente diferente de um filme 2-D. A experiência de assistir a um filme 3-D é bem diferente da do filme 2-D. Reagimos ao filme 2-D intelectual e emocionalmente. Com o 3-D, temos também um componente bem físico, a sensação de estar lá, o que aumenta a natureza imersiva da experiência de assistir. E para mim essa é a essência do cinema 3-D."

sábado, agosto 17, 2013

Imortais

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O cineasta indiano Tarsem Singh tem poucos filmes no currículo. Bem-sucedido realizador de videoclipes (entre os quais o premiado vídeo de Losing My Religion, do R.E.M.), estreou no cinema com a ficção científica A cela (2000), voltou a dar o ar de sua graça apenas em 2006, com Dublê de anjo. Dois longas elogiados pela bizarrice dos roteiros e pela plasticidade das imagens. Imortais (2011), o terceiro filme, talvez seja o ápice de sua "marca registrada": um cinema visualmente estarrecedor, com fotografia que lembra as telas de Turner e um apuro formal que beira o exagero. Com roteiro dos irmãos Parlapanides (greco-americanos com raízes em Nova Jersey), Imortais tem o mérito (?) de ousar, ou seja, mandar a mitologia para as cucuias, usá-la como "inspiração" ou "ponto de partida" para construir um universo ficcional paralelo. Os mais puristas torcerão o nariz para as liberdades tomadas pela dupla Charles e Vlas, mas eles parecem não dar bola às críticas. Concentraram o foco em Teseu (Henry Cavill), que assiste ao Rei Hipérion (Mickey Rourke) degolar a sua mãe. Discriminado e escravizado, com a ajuda de Zeus (Luke Evans) e de outros deuses do Monte Olimpo, e o amor da pitonisa Fedra (Freida Pinto), Teseu busca a vingança e a redenção. Nas palavras dos irmãos Parlapanides, o filme é sobre "um ateu que se torna mártir" (vide http://www.alexandrosmaragos.com/2011/09/parlapanides-brothers-interview.html). Estranha estética a serviço de um texto estranho: o resultado só poderia ser estranho, mas quem disse que "estranho" é uma qualidade indesejada? Desde já, Tarsem Singh faz também uma das cenas imortais dos efeitos 3-D: a em que Teseu lança quatro flechas quase simultâneas com o mágico arco de Épiro.




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domingo, agosto 11, 2013

Pequenos espiões 4

Não é sempre que os pais de espectadores mirins têm à disposição o incrível e inconstante talento de um diretor incrível e inconstante. Não é sempre que um diretor estreia com um clássico instantâneo como El Mariachi e constrói um currículo que inclui filmes imperdíveis como From Dusk Till Dawn e Sin City, mas que também se dá ao luxo de filmar meros caprichos como Machete. Não é sempre que um diretor texano de origem mexicana tem tanto conhecimento de causa para fazer filmes para o público kidult, afinal teve cinco filhos (Rocket, Racer, Rebel, Rogue e Rhiannon) com a mesma esposa, Elizabeth Avellan, de quem se separou nas filmagens de Planeta Terror, ao conhecer a atriz Rose McGowan. Não é sempre que um roteiro de filme infantojuvenil trata de um assunto tão relevante quanto dedicar o tempo à família e passar mais tempo com quem realmente amamos. Não é sempre que um roteiro tem a ousadia de mostrar que ter filhos a priori não impede pais e mães de correrem atrás de seus sonhos, muito antes pelo contrário. Não é sempre que uma família tem a oportunidade de usar bem o importante quesito tempo e assistir a um filme família legal como Pequenos espiões 4 (Spy Kids 4D - All the Time in the World), com Jennifer Alba liderando o elenco que conta com as participações de Alexa Vega e Daryl Sabara, os "pequenos espiões" originais, agora jovens adultos. Por fim, não é sempre que um filme é lançado em "4D Aromascope", modalidade de 3D acrescida de aromas e odores, raspando e cheirando cartões em determinadas partes do filme. Em casa, o negócio é colocar os óculos e curtir o aroma da... pipoca!

sábado, agosto 10, 2013

Outros mundos

O Cirque du Soleil continua sua surpreendente trajetória nos palcos e nas telas com Outros mundos (Worlds Away, 2012), com produção requintada de James Cameron e direção esmerada de Andrew Adamson (diretor dos dois primeiros filmes de duas bem-sucedidas franquias, Shrek - pela qual ganhou o Oscar - e Crônicas de Nárnia). Feito para o cinema, Outros mundos talvez só peque um pouco pela longa duração, em torno de 90 minutos. Uma tímida e linda espectadora (Erica Linz) se apaixona por um trapezista (Igor Zaripov) que desaparece ao cair no picadeiro e a acaba tragando junto e a levando a uma jornada onírica a outros mundos. A busca da garota pelo moço serve de delicado fio condutor com o objetivo primordial de visitar diversas e coloridas tendas onde se desenvolvem intrigantes coreografias. O filme serve de veículo para dar uma "palhinha" de nada menos que sete dos shows em cartaz em 2011 em Los Angeles: O, Mystère, Kà, Love, Zumanity, Viva Elvis e Criss Angel Believe. Ideal para se ver em casa, sem pressa, não necessariamente de uma sentada só. Para os fãs dos Beatles, é a chance de sentir o gostinho do aclamado espetáculo Love, que mescla a mágica do Cirque du Soleil com as inesquecíveis canções da banda de Liverpool.

Todo mundo quase morto



 Todo mundo quase morto é uma divertidíssima "comédia romântica" que conta a saga de Shaun (Simon Pegg, corroteirista do filme), jovem cujo relacionamento com Liz está a perigo por um singelo motivo: o pub Winchester. Explico. O mancebo só leva a garota sempre ao mesmo lugar na noite londrina, na companhia do amigo loser, que mais parece um morto-vivo. Ela sente falta de jantar fora. Ele promete mudar. Essa história é contada até os trinta minutos, enquanto no background coisas bizarras acontecem na capital inglesa. O espectador percebe que algo muito, muito estranho se desenrola, embora, aparentemente, Shaun e seu amigo não percebam. O único líquido vermelho que surge nessa espirituosa fase introdutória é a tinta que vaza no bolso de Shaun, que trabalha como vendedor em uma loja, ocasião em que recebe a visita do padrasto, cobrando de Shaun uma visita à mãe no aniversário dela. 
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A partir dos 30 minutos, porém, o inicial déficit sanguinolento será sobejamente compensado, afinal de contas, essa comédia romântica tem como cenário uma Londres não apenas metaforicamente dominada por humanos vazios e catatônicos e sedentos de sangue. Tanto que o recorrente bordão “You’ve got red on you” acaba se tornando uma piada interna e uma das frases cultuadas do filme de Edgar Wright (também roteirista de As aventuras de Tintim junto com Joe Cornish, o diretor de Ataque ao prédio). Britanicamente a dupla de amigos combate os retornados sem armas de fogo: Shaun usa um taco de críquete para abater os cambaleantes mortos-vivos. O poder de fogo só aumenta na sequência final (quando ironicamente um grupo de humanos não infectados se refugia justamente no pub Winchester) e justamente uma winchester é utilizada contra os zumbis. Tem muita coisa nesse filme a ser debatida num pub entre pessoas que curtem gore e cultuam os filmes de George Romero e quejandos. Uma delas é o constante encontro de Shaun com Yvonne, moça que o espectador supõe ter uma queda por ele, e que serviria como “prêmio de consolação”, caso Liz realmente der o fora nele. Quem vai ficar com Shaun? Descubra você mesmo.

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O Besouro Verde

Depois de uma vitoriosa carreira na direção de videoclipes e comerciais de televisão, Michel Gondry fez sua triunfal estreia como diretor de cinema com Brilho eterno de uma mente sem lembranças (2004). Continuou sua trajetória autoral em Sonhando acordado (2006). Depois de cinco anos com projetos menores, volta ao mainstream como o olhar por trás das câmeras de O Besouro Verde (The Green Hornet, 2011). Desde já, Michel Gondry entra para a seleta lista de diretores com cenas clássicas em 3-D. Refiro-me à singela cena em que Kato (Jay Chou) abre duas long necks com um golpe de karatê. A cena funciona às mil maravilhas no 3-D doméstico e dá a tônica do filme: muita diversão com uma direção eficaz, que sabe aproveitar a mágica do 3-D. Alguém poderá criticar as caras e bocas de Seth Rogen na pele de Britt Reid, herdeiro de um império das comunicações que resolve, com a ajuda do engenhoso Kato, criar um anti-herói, misto de contraventor e benfeitor, e ordena o staff do jornal estampar sempre na primeira página suas ambíguas ações noturnas. Mas o fato é que Seth Rogen, a exemplo de Jim Carrey, é o tipo de ator com raízes na comédia mas versátil. A propósito, um dos pontos fortes de O Besouro Verde é justamente o elenco: desde o genial (e eterno coadjuvante) Christoph Waltz na pele do hilário vilão Chudnofsky; Tom Wilkinson como o rigoroso pai de Britt; o já mencionado Jay Chou encarnando o inventivo Kato; e, last but definitely not least, a sempre musa Cameron Diaz como a competente e seriíssima secretária Lenore Case. No frigir dos ovos, O Besouro Verde surpreende positivamente - e a precisão cirúrgica do diretor Michel Gondry contribui muito para isso.

domingo, agosto 04, 2013

Meus amigos dinossauros








O fato de Dino Time (Meus amigos dinossauros, 2012) não ter sido lançado nos cinemas mundiais demonstra o atual patamar da animação, em termos de quantidade e qualidade. Nesse cenário de acirrada competição, mesmo um filme com as vozes dos irmãos Baldwin, Jane Lynch e Melanie Griffith (que dubla Tyra, a mamãe tiranossaura que adota filhotes humanos) acabou relegado a segundo plano.  Não entrou nos cinemas no circuito internacional e teve de se contentar com uma carreira “apenas” nas locadoras. “Apenas” entre aspas porque quem sai ganhando com essa fartura de opções é o público do 3-D doméstico. Mas, diga-se de passagem, a fartura também exige pais mais informados, para uma escolha não impulsiva. Aí vai a informação útil: Meus amigos dinossauros vale a locação, sem dúvida. Roteiro bem amarrado que brinca com conceitos explorados por H. G. Wells em A máquina do tempo. As crianças Ernie, Max e Julia acidentalmente acionam a máquina do tempo fabricada pelo Dr. Santiago (pai de Max), que, com a ajuda de Sue (mãe de Ernie e Julia), tenta resgatar o trio viajante no tempo das garras (e dentes) dos ferozes sarcossauros. Como em outras produções de menor orçamento, esta coprodução da Coreia do Sul e dos EUA, dirigida por Yoon-Suk Choi e John Kafka, apresenta um discreto uso do 3-D, agindo mais em termos de profundidade do que saltando para fora da tela (como no menu do filme).