Com exceção de uma sequência (a protagonizada por Mike Myers), Bastardos inglórios é impecável. A cena de Myers não convence porque fica indecisa entre o esculacho e a verossimilhança interna. Tipo de cena que destoa e pode ser sacada com ganhos.
No mais, os capítulos do novo filme de Quentin Tarantino são repletos de suspense e humor na medida certa. O charmoso e ao mesmo tempo tenebroso cenário é a França controlada pelos nazistas, retratados no capítulo 1 como manipuladores, asquerosos, racistas e antissemitas. O coronel Hans Landa (Christoph Waltz), um dos personagens mais nojentos da história do cinema, visita a residência de um produtor de leite à procura da família Dreyfus, que estaria refugiada na propriedade. A sequência toda é um primor e já vale o filme, com uma cena homenageando o filme Rastros de ódio (The searchers), de John Ford. O capítulo 1 introduz além de Landa outra personagem essencial da história: a selvagem Shosanna Dreyfus (Mélanie Laurent, na foto).
Para contrabalançar a violência nazista, a América envia um micropelotão comandado pelo tenente Aldo Raine (Brad Pitt) com o único objetivo de instalar o terror nas hostes alemãs por conta de barbáries como tirar o escalpo dos inimigos mortos e marcar a suástica na testa dos vivos. Logo a fama dos "Inglourious basterds" se espalha e alguns de seus integrantes ganham alcunhas sugestivas como o sargento Donnie Donowitz (Eli Roth), que passa a ser conhecido como o "Urso Judeu" e o tenente Aldo como "Apache". O sargento Donnie ganha fama por destroçar prisioneiros indefesos com um taco de beisebol em espetáculos dantescos.
Os desdobramentos e episódios seguem a estrutura tarantiniana de diálogos cortantes e inusitados com suspense crescente que acabam em múltiplos ápices banhados de sangue, suor e lágrimas. A selvageria dos dois lados é enfatizada sem firulas. Não há mocinhos nem bandidos, apenas pessoas sem moral ou vingativas. Vingança fenomenal é a planejada por Shosanna, agora morando em Paris e proprietária de um cinema. Com a ajuda do amante Marcel (Jacky Ido) ela vai provar que a vingança é um prato que se come frio.
Ser impecável não significa ser ótimo ou genial, mas fato inegável é a rapidez com que os 210 minutos frenéticos se escoam. As duas horas e meia passam num piscar de olhos, e isso é sinal de que o filme é pelo menos bom. É bem verdade, Tarantino não usa o cinema para denunciar nem para provocar profundas meditações. Realiza uma espécie de entretenimento com conteúdo estético e texto apurado. Num século em que o cinema e a literatura se banalizaram, um diretor como Tarantino se destaca por sua originalidade, ironia e capacidade de desconcertar.
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