sábado, fevereiro 09, 2013

O mestre

Enunciado. Defina em três palavras o cinema de Paul Thomas Anderson. Resposta. Densidade com estilo. Exemplos: Boogie Nights - prazer sem limites (1997), Magnólia (1999), Embriagado de amor (2003) e Sangue negro (2007). Com uma singular predileção por assuntos/personagens controversos e um incomparável talento para urdir cenas que permanecem na retina, Thomas realiza filmes de compasso lento e árdua deglutição. Em termos visuais, o cinema de Anderson é uma mescla bizarra de aridez minimalista com detalhismo extravagante. Em outras palavras, Anderson é um cineasta bipolar que tenta, filme após filme, conciliar extremos, com resultados que parecem frustrar as massas. Quer mais bipolaridade? A vigente e unânime opinião sobre O mestre: o filme é "chatésimo", mas "vale" pelo "show de interpretação" de Joaquin Phoenix. Arlequinal. Como um filme pode ser uma droga e ter uma excelente atuação? Uma soberba atuação pressupõe um personagem consistente numa história significativa. Se o espectador consegue reconhecer a suprema qualidade do desempenho de um ator, bem, algum mérito o roteirista/diretor teve nesse processo. Enquanto alguns cineastas privilegiam o ritmo da narrativa a qualquer preço, Anderson é de outra cepa: quer entender e investigar a alma de seus personagens, e se a história for para o brejo nesse entremeio, azar. Mais especificamente, O mestre aparenta ser malcosturado porque o roteiro é uma colcha de retalhos que envolve partes da vida de Ron Hubbard (criador da cientologia), da vida do escritor John Steinbeck e fragmentos das experiências do ator Jason Robards na Marinha. Por se originar desse mosaico de fontes, é até compreensível certa falta de foco narrativo em O mestre. Imperdoável mesmo é o filme ser "vendido" como suposta análise sobre a "polêmica" da cientologia. Essa afirmação chega às raias do absurdo. Na verdade, O mestre serve como estudo sobre seitas religiosas em geral. Não há um aprofundamento sobre crenças ou princípios específicos. Phoenix (que retorna após declarar a carreira encerrada com o filme Two Lovers) encarna Freddie Quell, ex-combatente da Segunda Guerra Mundial que se torna um fotógrafo no pós-guerra. Sua personalidade conturbada domina o filme até o destino de Quell se ligar a Lancaster Dodd, autor de autoajuda/líder de seita interpretado por Philip Seymour Hoffman. A partir daí, O mestre se transforma num hercúleo duelo entre dois atores e personagens para ver quem é "principal" e quem é "coadjuvante". A certa altura, a figura de Lancaster se sobressai e Quell vai para o segundo plano. A mais contundente cena do filme é a que os dois atores se digladiam com palavras e gestos, cada qual trancafiado numa cela contígua. É exatamente isso que P. T. Anderson consegue fazer: coloca o cérebro (Hoffman) e o coração (Quell) de cada espectador numa cela separada, os submete a grandes pressões e os deixa ali, para ver quem vence.

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