quinta-feira, setembro 28, 2017

First Blood



FIRST BLOOD

O primeiro beijo. A primeira noite. O primeiro post do primeiro blog. O primeiro livro. O primeiro longa-metragem. Na vida como no cinema, tudo é aprendizado. Nem sempre se acerta em cheio na primeira vez.






Muitas vezes, a inexperiência fica sendo a marca do primeiro passo. Noutras, apesar das limitações e do baixo orçamento, a estreia revela características que vão acompanhar a carreira do diretor. Humor, ironia, originalidade, ritmo, edição dinâmica, habilidade com os atores, simplicidade, exagero, fantasia, consciência social, enfim, fatores que vão moldar o estilo e o talento do realizador.
O caso de James Cameron é sui generis. Ninguém imaginaria, assistindo a seu primeiro filme, que 15 anos depois ele faria Titanic, exclamaria "Eu sou o Rei do Mundo!" na festa do Oscar e levaria para casa a estatueta de Melhor Diretor. Piranha 2 – Assassinas Voadoras (1982) é o trash mais trash que você vai achar na locadora. Lance Henriksen investiga piranhas aladas mutantes sedentas por jugulares humanas, num banho de sangue e peitos, digo, efeitos toscos. Para compensar, na segunda tentativa, Cameron fez, a custos relativamente baixos, um pequeno clássico da ficção cientí­fica: O Exterminador do Futuro.
O neozelandês Peter Jackson, da fabulosa trilogia O senhor dos anéis e da não menos estupenda trilogia O hobbit, também começou, vamos dizer assim, com o pé esquerdo. Bad Taste (1988), sobre uma estapafúrdia invasão alienígena, não é exatamente uma obra respeitável. O mocinho é atingido na cabeça, abrindo um buraco no crânio. Parte de sua massa encefálica escorre, ele junta e põe no lugar. E otras cositas más, como a risível casa que levanta voo. Com Braindead (Fome animal, 1992), Jackson leva às últimas consequências sua capacidade de surpreender as retinas e embrulhar o estômago do espectador. Muda o estilo, mostrando sinais de maturidade, em Almas Gêmeas (1994).





Peter Bogdanovich, autor do clássico A última sessão de cinema (1971), orgulha-se de ter assinado um bom filme na estreia: o policial Na mira da morte (Target,1968). Na verdade, porém, Bogdnavich, escondido sob o pseudônimo de Derek Thomas, já havia cometido o esdrúxulo Voyage to the Planet of Prehistoric Women (68), em que astronautas descobrem em Vênus uma nova e bela raça de mulheres.
Sam Raimi, o responsável por blockbusters como Homem Aranha e suspenses irretocáveis como Um plano simples, foi, no início da carreira, um especialista em terror. O horripilante A morte do demônio (Evil Dead,1983) foi tão admirado que virou uma trilogia com Uma Noite Alucinante (Evil Dead 2) e Army of Darkness (1993) e consagrou o ator Bruce Campbell como o eterno anti-herói Ash.
O respeitado Francis Ford Coppola, de Apocalypse Now e da série O Poderoso Chefão, iniciou-se na arte da direção ainda estudante, com o patético Os amantes do nudismo (Tonight for Sure,1960), sobre dois homens, um que espia mulheres e outro que enxerga mulheres nuas em todos lugares.


 
De outras vezes, a energia da estreia vem acompanhada de um roteiro interessante, resultando em pequenas gemas que vale a pena garimpar. O diretor de Feitiço da Lua, Norman Jewison, estreou com Vinte quilos de confusão (40 Pounds of Trouble, 1962), onde um gerente de hotel, assediado pela sobrinha do patrão e às voltas com uma menina de oito anos abandonada pelo pai, resolve levar ambas a Disneylândia.
Alan Pakula, do consagrado drama Todos os Homens do Presidente e do suspense Acima de Qualquer Suspeita, iniciou a carreira com o esplêndido Os anos verdes (The Sterile Cuckoo, 1969), onde um tímido aluno é assediado por uma mulher mais velha. Spike Lee começou, com Joe’s Bed-Stuy Barbershop: We Cut Head (1983), sua filmografia marcada pela consciência social. Jonathan Demme, vencedor do Oscar por O silêncio dos inocentes (1990), disse ao que veio logo no debut: Confissões íntimas de um presí­dio feminino (Caged Heat, 1974), em que uma mulher inocente é presa e explorada sexualmente na prisão, atingiu patamares de cult.




Primeiros lançamentos podem se tornar cults instantâneos. Gosto de Sangue (Blood Simple, 1984), dos irmãos Coen, além de marcar o iní­cio de uma bela carreira, é uma memorável homenagem ao filme noir. Darren Aronofsky, o diretor do oní­rico Réquiem para um Sonho, estreou com o cerebral Pi, a história de um matemático e suas intrigantes descobertas. E o que dizer do surreal Eraserhead (1978), o primeirí­ssimo de David Lynch, o filme que todo cinéfilo gostaria de ver, mas ainda não viu? Cult dos cults, para mim, é outro filme difícil de conseguir, o primeiro de Peter Weir: The Cars that Ate Paris, feito na Austrália em 1974, retrata uma estranha cidade parasita que sobrevive economicamente provocando acidentes e vendendo as peças das sucatas.



Malfadada ou maravilhosa, grotesca ou séria, experimental ou linear, ambiciosa ou singela, cada estreia é sempre um marco. Mas o que vai definir o sucesso, em nossas vidas ou na carreira de um diretor, é a perseverança.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é bem-vindo!