O ALUCINANTE OLHAR DE SAM RAIMI
Uma Noite Alucinante 2 é um filmaço de terror e humor apetecível para um nicho mercadológico específico: ou seja, pessoas com um parafuso a menos, multissequenciais, não lineares – pessoas que se permitem, de vez em quando, achar graça de bobagens...
Não que Uma noite alucinante 2 seja um filme bobo, muito antes pelo
contrário. Para mim, é seríissimo. Defendo esse filme com unhas e dentes. Os
movimentos vertiginosos da câmera entrando na casa mal-assombrada são até hoje
copiados. O lance da mão tomando vida própria, e o pobre Ash tendo de amputá-la
com a motosserra, está entre as cenas ao mesmo tempo mais dantescas e estapafúrdias
da história do cinema.
Depois pesquisei e descobri que Uma noite alucinante 2 (Evil Dead
II- Dead by Dawn) é, na verdade, praticamente uma refilmagem, com orçamento
mais polpudo, do primeiro filme de Sam Raimi, realizado em 83: Evil Dead (que no Brasil já saiu em vídeo,
com o estúpido título A morte do demônio). A trilogia se completaria anos depois, com o
lançamento de Army of Darkness (1992), que eternizaria o anti-herói Ash
(Bruce Campbell) e a mais romântica frase já proferida em um filme de terror,
dita a Embeth Davidz, antes de uma cálida noite de amor: “Give some sugar,
baby”. Depois veio Darkman, vingança sem rosto (90),
onde, na verdade, começou a nova onda de filmes baseados em HQ. Dos créditos
iniciais aos finais, Darkman é uma aula de como adaptar banda desenhada ao cinema. Não é para menos que, uma década
depois, Sam Raimi seria escolhido como o olhar por trás da câmera da série
Spider Man.
Vai analisar, a obra de Sam Raimi é supercoerente. Estamos em 93. Está completa a trilogia Evil
Dead. Sam Raimi já esgotou a fonte, usou e reusou o ator fetiche Bruce Campbell
(que faz uma ponta em Darkman como o cara que se vira no fim do filme, em
Spider Man como o apresentador das lutas e em Spider Man 2 como o barrigudo
porteiro do teatro). Já fez parceria com os Coen. Já expressou a paixão pelas
HQs. Qual é o próximo passo? Um western, é claro!!
Ah, sim, antes que me esqueça: entre os dois primeiros Evil Dead, ele lançou
uma comédia peripatética, com roteiro dos irmãos Coen: Crimewave (Dois heróis bem
trapalhões). Este filme, realizado em 1985, “disponível nas melhores locadoras”, é na linha de
Arizona nunca mais, com umas pitadas noir.
Rápida e mortal (The Quick & The Dead, 95) é um faroeste clássico. Estarei exagerando? Clássico é adjetivo para Casablanca. Matar ou Morrer é um faroeste clássico, dirá algum estudioso da matéria. Bem, hipérboles à parte, o fato é que Sharon Stone, no auge da carreira, escolheu o diretor que quis, no roteiro que escolheu, e o resultado foi um estouro. Um dólar nem um pouco furado. E o elenco não deixa por menos: Russel Crowe, Leonardo DiCaprio, Gene Hackman, Lance Henriksen...
Mudança sutil de estilo veio com Um plano simples (98). Aqui, Sam Raimi afasta-se um pouco da virtuosidade visual e experimenta um tom mais sóbrio, centrado na direção dos atores. Um passo simples e à frente.
Toda banda boa tem seu disco ruim. E eis que a carreira de um bom diretor tem
seus deslizes. Estou falando de “For Love of the Game (99)”, comédia romântica com Kevin Costner. Aqui Raimi
tipo “se vendeu” para o sistema, não foi um filme “de autoria”,
definitivamente. Torci o nariz para esse filme, em protesto. Nem fui vê-lo no
cinema. Acabei vendo em vídeo, na casa de minha mãe, e olha: é até bem bonzinho.
A fantasia e a aventura são, sem dúvida, a sua praia. Tudo o que Sam Raimi aprendeu, desde a fase trash-escatológica de Evil Dead até o sisudo Um plano simples, a alucinante capacidade de inventar tomadas e movimentos de câmera, adicionada à maturidade na direção dos atores, desembocou de forma cristalina na série Spider Man. Ninguém chega aonde chega ao acaso. O talento e o treinamento são essenciais. A série Spider Man está aí para provar. Alguém discorda?
O bom filho à casa torna: Sam Raimi voltou ao suspense com The Gift (O dom da premonição,
2000). Porém, o tom aqui é outro. Puxando para o “suspense psicológico”,
levando-se completamente a sério. O roteiro chafurda no pântano dos
lugares-comuns, e o que podia ser uma volta aos velhos tempos, deixou um pouco
a desejar. Sam Raimi parecia preocupado em mostrar que pode ser um diretor de
filmes “sérios”.
A fantasia e a aventura são, sem dúvida, a sua praia. Tudo o que Sam Raimi aprendeu, desde a fase trash-escatológica de Evil Dead até o sisudo Um plano simples, a alucinante capacidade de inventar tomadas e movimentos de câmera, adicionada à maturidade na direção dos atores, desembocou de forma cristalina na série Spider Man. Ninguém chega aonde chega ao acaso. O talento e o treinamento são essenciais. A série Spider Man está aí para provar. Alguém discorda?
Depois da série Homem-Aranha, Sam Raimi realizou apenas dois filmes: Drag Me to Hell (2009) e Oz - mágico e poderoso (2013), seu único filme 3-D.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é bem-vindo!