sexta-feira, junho 30, 2017

O salário do medo


         


      A cidadezinha guatemalteca  de Las Piedras, na costa do Pacífico, vive da exploração do petróleo, realizada por uma companhia ianque. A mão de obra barata inclui nativos e índios. Forasteiros sem emprego têm como ponto de encontro o Corsário Negro, o bar que reúne a “nata” local. É ali, em meio ao ócio e ao desalento, que se fica sabendo do serviço fatídico.

            A empresa necessita quatro motoristas experientes para uma missão inusitada. O transporte de nitroglicerina, em caminhões comuns, sem nenhum amortecedor especial, até um campo de petróleo. O perigo é grande. O dinheiro, também. O francês Mario não hesita em participar dos testes. Com sangue frio e habilidade, é um dos escolhidos, para o sofrimento de sua amante, a atendente de bar Linda, interpretada pela brasileira Vera Amado Clouzot.

           

      
       O diretor Henri Clouzot (que fez o imortal O corvo) conseguiu, em O salário do medo, filme vencedor da Palma de Ouro em Cannes, em 1953, transmitir com sucesso o sentimento que se evola das páginas do livro de Georges Arnaud. Lançada em 1941, a obra resume a angustiante condição humana de não ter como escapar, não ter como modificar uma rotina de ócio e opressão, não ter como evitar o sentimento paralisante do medo.

            Arnaud parece ter escrito com o cinema em mente. Escolheu o presente do indicativo. Em cada parágrafo revela-se uma cena; em cada diálogo, o caráter de um personagem. O livro é rápido (180 páginas) e do tipo difícil de largar. O filme, de 2 horas e meia, não parece longo; fiel ao original, é um exemplo de adaptação séria, sem apelações.




            Para se ter uma ideia, o livro tem cenas de sexo, o filme não. Cenas de suspense, não raras no livro, não são aumentadas no filme. O filme limita-se a contar, na melhor linguagem cinematográfica, a saga destas almas perdidas.

             Os perfis dos personagens são fiéis ao livro, mas alguns mudam de nome na película. No livro, o corajoso protagonista é Gérard Stürmer, no filme, é Mario. Seu companheiro de equipe, no livro, é o romeno Johnny; no filme, o francês Jo. Durante toda a viagem excruciante, a coragem de Mario irá conviver com a covardia de Jo. Pelo seu trabalho como o motorista que não consegue controlar o medo, Charles Vanel foi premiado em Cannes. Yves Montand é Mario.



            A fase preparatória, onde há o desenvolvimento dos personagens, ocupa 40% do tempo, tanto do filme como no livro.

            Diferenças significativas entre o livro e o filme são poucas. No filme foi retirada a parte em que os caminhões precisam atravessar um povoado. O padre pede aos motoristas que tomem um desvio, segundo ele, em ótimas condições. As duas equipes concordam, porém, precisam voltar, devido ao péssimo estado da estrada. Bimba, o espanhol, vai até a igreja e espanca o padre. No filme, a cena que “substitui” essa passagem é a presença de uma grande pedra na estrada.

            No correr das linhas ou no desempenho dos atores Ives Montand e Charles Vanel,  o desespero, o cansaço, o pavor dos motoristas são transmitidos minuciosamente, e o leitor ou espectador parecem estar dentro da cabine do caminhão, transportando nitroglicerina, em estradas sinuosas e esburacadas da Guatemala, onde um simples erro de câmbio, uma freada brusca, uma acelerada em falso, enfim, a mínima falta de atenção, pode mandar tudo pelos ares.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é bem-vindo!